Dos caminhos percorridos desde o choro até o sorriso

Postado por Luan Henrique | | Posted On quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013 at 17:45

solidao

  Cansado, frustrado, infeliz.. Essa é a história de Eleandro, nascido na classe média alta, mas que fracassou em tudo na vida em razão de ter feito apenas escolhas erradas durante o caminho. Ele teve oportunidades de ser alguém, de ser feliz, mas jogou tudo isso fora inconscientemente durante anos em que preferiu se trancar no seu mundinho e fingir ser quem não era, em sua cabeça ele sempre foi superior do que todo mundo, e sua bolha fantasiosa o impediu de ver que ele era apenas uma piada para as pessoas. Nunca correu realmente atrás do que queria, sempre esperou que tudo fosse entregue em suas mãos. Se isso acontecia ele deixava de se importar com tal coisa em pouco tempo, se não acontecia ele logo se esquecia e bloqueava de sua mente.

  Nunca foi muito bom com pessoas, não sabia interagir e nem fazia questão disso. A solidão, pensava ele, era sua sina, mas a falta de pessoas começou a atormenta-lo. Eleandro não odiava o mundo, pelo contrário, ele gostava de admirar o céu e pensar como era perfeito, aquele tom de azul maravilhoso sobre sua cabeça, recheado de nuvens fofas e lindas que pareciam ter sido moldadas uma a uma por mãos brilhantes e brincalhonas para divertir seu telespectador que poderia ter o privilégio de vê-las se transformar gradualmente naquilo em que ele gostaria de ver. O mundo era belo, a vida é que ele odiava.

  Já tecnicamente mais maduro, Eleandro começou a rever seus conceitos de como havia vivido até agora. Ele estava na merda. Ninguém se aproximava dele, estava encalhado em contas, ele não tinha amigos, nunca havia tido uma namorada, até que certo dia alguém apareceu, e ele achou que era exatamente isso o que faltava para ele ser feliz. Por algum tempo ele achou que realmente foi feliz, mas o tempo foi passando e ela começou a incomoda-lo, não que ela fizesse alguma coisa para despertar esse sentimento nele, ela era até uma boa garota, romântica e de bem com a vida, mas na mente de Eleandro ela era feliz demais, boa demais, perfeita demais e isso não combinava em nada com ele.
- Eu achei que você se importava comigo Eleandro – Disse Carol, quando recebeu a notícia de que ele iria terminar tudo.
- Desculpe, mas durante a minha jornada desde a infância até esse momento eu acabei não desenvolvendo a habilidade de me importar – Foi sua resposta seca que destruiu o coração da pobre Carol, que até o momento não tinha entendido que estava namorando com um idiota.

  A felicidade não estava em um relacionamento, concluiu Eleandro, que resolveu procurar em latas de cerveja e carreiras de cocaína. Tudo foi muito rápido a partir desse ponto, em pouco tempo ele já havia bebido mais do que uma pessoa normal consegue beber em toda a sua vida, e cheirado mais do que poderia pagar para seu traficante. A coisa começou a ficar feia após uma surra levada por 3 capangas as 5h da manhã em um beco da favela, que lhe renderam 3 costelas quebradas, 5 dentes e uma semana internado no hospital evangélico. Por sorte sua avó passou o tempo todo ao seu lado, chorando e implorando que ele mudasse de vida, e pedindo a Deus que não deixasse ele morrer naquele lugar cheio de gente mal encarada. Seu primo também pagou sua conta para o traficante em comum que possuíam, após esse aviso ele sabia que viria a morte e não queria isso para seu parente com que ele mais se importava.

  Depois desse acontecido Eleandro resolveu parar de beber, seria difícil, ele sabia muito bem disso, mas iria conseguir, estava cansado de se dar mal em tudo. Arrumou um emprego em uma fábrica de chocolates e começou a se dedicar totalmente ao trabalho. Ele fazia mais horas que qualquer um dos funcionários, e se seu patrão pedisse para que ele limpasse o cuspe de seu escritório, ele iria correndo pegar um rodo e um pano úmido. Ele colocou na sua cabeça que se trabalhasse duro o dia inteiro sem reclamar, quando chegasse em casa de noite, apenas um banho quente e sua cama seriam uma recompensa tão boa para seu corpo que ele nem pensaria que precisava beber.

  Tanto trabalho duro e sem ter onde gastar seu dinheiro, fizeram de Eleandro um homem rico em poucos anos. Aos 27 ele já era gerente da empresa, e aos 30 se tornou presidente de uma das maiores fábricas de chocolates do mundo. Era um homem rico e bem sucedido, mas com tanto dinheiro ele ainda não conseguia se sentir feliz. Descobriu que quanto mais você tem, mais as pessoas praticam a falsidade para seu lado. Ele continuou não confiando em ninguém, e suas necessidades humanas masculinas eram feitas por acompanhantes de luxo que ele insistia que não falassem uma palavra sequer com ele. Ele dizia que suas bocas só deveriam se abrir se fosse à trabalho, ‘e nenhuma de vocês aqui é palestrante, certo garotas?’

  Um câncer o abateu aos 52 anos de idade, ele estava incrivelmente acabado para a sua idade, tinha a aparência de um idoso de 90 anos que passou a vida inteira fumando. No leito de morte, sozinho em uma cama gelada no 5º andar de um hospital particular, ele começou a rever toda a sua vida, tudo o que havia passado e o quanto deixara de aproveitar procurando a tal felicidade. Lembrou-se de que só tinha recebido um beijo sincero durante todo aquele tempo, e gostaria de sentir aquilo novamente. Tinha juntado tanto dinheiro, que agora, sem herdeiro algum, iria ficar na terra para os outros aproveitarem se divertindo, coisa que ele não fez. Nesse momento uma lágrima surgiu em seus olhos e seu ultimo pensamento em vida foi: “Eu queria ter vivido mais”.

A dor da perda

Postado por Luan Henrique | | Posted On terça-feira, 26 de fevereiro de 2013 at 19:14

tristonho

  Ele estava presente quando eu perdi a minha virgindade. Não participando do ato em si, e nem estando no mesmo quarto observando a cena como se fosse um adolescente tarado espionando a sua vizinha pela janela do seu quarto enquanto se masturbava, não, ele havia me levado para um puteiro de quinta categoria e escolheu junto a mim a honrosa vítima do descabaçamento tardio de um já não tão jovem garoto nervoso e com tremedeiras. Foi ele quem pagou e checou o produto antes de entregar nas minhas mãos. Não foi algo assim tão bom no final, muita gritaria fingida durante meia hora e minha concentração foi embora, sem que eu conseguisse finalizar o objetivo principal de todo homem em relação ao sexo. Mas foi algo memorável.

  Ele estava presente na maior merda que já fiz envolvendo brigas, quando eu discuti com um policial à paisana no meio de um estacionamento lotado após uma enorme bebedeira dos dois. Gritei e chorei igual a uma criancinha chata no corredor de um supermercado, caí de moto várias vezes na volta para casa e chamei uma atenção enorme para mim. Eu poderia ter sido preso ou espancado esse dia, mas ele estava lá para evitar que isso acontecesse.

  Ele estava presente em outra cena de sexo ruim e mal feito, mas dessa vez era de graça. Falei palavras de amor no meio da rua e besteiras impensáveis em cima da cama. Ele tinha me apresentado a ela e dias depois me levado até a sua casa, para um segundo tempo que nunca aconteceu, aparentemente ela tinha um filho e um marido.

  Ele estava presente em toda festa que realizei na minha casa, desde churrascos pequenos para duas pessoas até festas enormes com vários convidados bebendo de graça e reclamando das minhas atitudes após saírem. Ele estava lá quando ganhei aquele beijo maravilhoso e fui trocado logo em seguida por um roqueiro imbecil. Ele me ajudou a superar tudo isso enchendo a cara violentamente ao meu lado.

  Ele estava presente nas nossas viagens sem rumo que fazíamos de vez em quando guiados pela loucura e pela cerveja. Fomos para vários lugares, bebemos várias bebidas diferentes durante o caminho e fomos rejeitados por várias mulheres durante o processo. Mas nunca deixamos de sorrir juntos, mesmo quando brigávamos e discutíamos por motivos fúteis.

  Ele estava presente no meu nascimento, nos meus aniversários, nas minhas conquistas e principalmente nas minhas derrotas, que foram muitas. Ele sempre estava lá, me dando forças para continuar, me ajudando a crescer e me desenvolver como o ser humano que sou hoje.

  Ele estava presente a minha vida inteira, e agora, quando eu mais preciso dele, ele se foi. Não sei se é para sempre, mas ele se foi e eu estou sozinho pela primeira vez, e estar tão sozinho assim machuca, machuca demais. Queria que ele estivesse aqui, tudo isso seria muito mais suportável se ele estivesse aqui comigo, mas é tarde para pensar nisso, sentirei muito a sua falta, se algum dia você mudar de ideia eu estarei te esperando, aqui, sozinho no meu quarto, de braços abertos para recebê-lo novamente, e espero que isso aconteça em breve, não sei se irei sobreviver por muito mais tempo sem você, orgulho.

Sonhos chapados de um jovem sem cabeça

Postado por Luan Henrique | | Posted On terça-feira, 19 de fevereiro de 2013 at 15:55

 telo

  “Essa vida é uma merda”, eram as palavras mais pronunciadas pela boca suja e podre de Jurandir, um paulista classe média alta sofredor que sonhava em ser um músico, mas nunca aprendeu a tocar nada e nunca escreveu sequer uma letra, mas ele tinha a perseverança dos gênios e a malandragem dos ignorantes, qualidades que o levariam até o pilar mais alto da fama, ou as profundezas mais baixas do empregado com salário mínimo.

  Mas o destino, ahh esse maldito, pilantra e insuportável destino bateu à sua porta certa manhã. Jurandir estava se decidindo com qual roupa sairia para um baile a fantasia do colégio, ele decidiu que usaria as velhas fantasias de carnaval de seu falecido avô, que estavam amarrotadas em caixas velhas no fundo do porão de seu apartamento, quando, indeciso entre ir de índio ou de  líder de torcida, ele encontrou um diário. Era um diário desgastado, com páginas amarelas e capa de couro, e curioso e com muito tempo livre, Jurandir começou a ler.

  Entre besteiras sentimentalistas de um velho apodrecido, ele achou um trecho de uma marchinha de carnaval – pelo menos foi isso que ele achou que fosse, devido a sua letra inspiradora – e se admirou de forma tão comovente que resolveu utiliza-la para criar um sertanejo e impressionar as garotinhas de seu colégio. Faltava a metade da página, mas ele achou que já possuía linhas o suficiente para ser uma canção universitária de 3 minutos, e isso bastava.

  A música estourou em poucas semanas, os contatos de seu pai que estavam na primeira apresentação acharam que aquele seria o novo Hit de verão, ligaram para gravadoras que se impressionaram com o talento nato do jovem garoto em cantar uma melodia tão doce e tão profunda como aquela, logo sua música estava na internet e teve quase 30 milhões de visualizações em apenas 2 minutos e meio. Dinheiro começou a cair do céu, convites e mulheres igualmente. O seu achado seria histórico.

  Após algumas apresentações em programas de tv, rádios, internet, estádios e palanques flutuantes, as pessoas começaram a se perguntar quando o próximo sucesso seria lançado, mas Jurandir não tinha nada, e com isso, se afundou nas drogas. Começou de leve, com algumas pitadas de Marionégano em sua pizza matinal, e foi evoluindo, até que sua realidade se perdeu totalmente entre sonhos chapados de um jovem sem cabeça.

  Mas seu sucesso continuava crescendo, versões em inglês, turco, espanhol, tupi-guaraní, francês e na exclusiva língua do P foram lançadas, e ele se transformou no artista brasileiro mais bem sucedido lá fora, tendo até John Lennon ressuscitado apenas para regravar essa obra prima.

  Mas a fama não foi o suficiente para o querido Jurandir, toda noite quando ele tinha um pequeno lapso de consciência ele relia o inscrito original de sua música, se imaginando como ela terminara na mente de seu saudoso avô. Seu começo era genial e magnífico, seria o restante da música tão grandiosa assim? Ou será que terminava de forma desastrosa como a vida de seu criador? Ele ficava frustrado por não saber e cada vez se afundava mais nas drogas.

  Jurandir morreu cedo, aos 27 anos de idade, fruto de uma overdose bombástica, mas sua fama perdurou para todo o sempre, e até hoje a letra de seu grande sucesso pode ser ouvida em qualquer lugar que você procure, ou, para os fãs mais fiéis, sua letra foi escrita em sua lápide de mármore no cemitério municipal, letra essa que dizia o seguinte:

“Cheirei um pó, fumei um baseado
fiquei doidão eu fiquei acabado.
Não conseguia mais ficar parado
Então eu fui, e comi um viado

Mas será que o viado era eu,
será que o viado era eu?
Será que o viado era eu
será que o viado era eu?” x48

Corações partidos de uma alma sem futuro

Postado por Luan Henrique | | Posted On quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013 at 19:56

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  Era uma manhã de Outono em Curitiba, eu devia ter meus 7 ou 8 anos na época e vivíamos em um barraco caindo aos pedaços na beira de uma valeta em um dos bairros mais pobres e violentos da cidade. Minha mãe, Letícia, saia todo dia muito cedo de casa e voltava muito tarde, apenas para gritar comigo ou para ser surrada pelo meu pai, que até era um cara legal, sabia que era corno e lidava com isso bebendo e espancando as nádegas de mamãe e, muito raramente, a minha.

  Certo dia eu não estava conseguindo dormir e pedi para que meu pai lesse um pouco para mim na cama, ele não estava completamente bêbado ainda, mas estava trabalhando duro nisso.
- Nessa escola de merda não ensinaram você a ler ainda não? Você já tem quantos anos? 15, 16?
- Eu sei ler papai, mas algumas palavras eu não conheço – tirei meu livrinho infantil que trazia dentro de minha jaqueta e abri na página marcada que eu tinha tentado ler anteriormente.
- O que significa “vulgar” papai?
- Porra Ademilson, vulgar é a sua mãe, aquela vagabunda.

  Depois desse dia nunca mais pedi para ele ler nada pra mim, mas meu aniversário estava chegando e eu estava ansioso para saber se nesse ano eu poderia pelo menos almoçar. Os dias se passaram muito lentamente naquela semana, minha mãe chegava em casa com o batom borrado e meu pai desmaiava no sofá da sala com a tv ligada. Sábado parecia que jamais iria chegar, mas para a minha surpresa, ele chegou, trazendo mais experiência e maturidade para a minha cabeça.

  Meu pai tinha saído cedo de casa, eu estava sozinho quando acordei. Comi um pão seco e fiquei sentado perto da janela observando a chuva que caia lá fora. Mais ou menos umas 11 horas da manhã ele abriu a porta, ensopado e gritando palavrões e amaldiçoando Deus e o mundo.
- Toma aqui moleque, feliz aniversário e blábláblá, agora vá pro seu quarto que eu quero ficar sozinho.

  Era um embrulho vagabundo, algum objeto oval que me deixou com uma mistura de ansiedade e a mais pura alegria. “Pelo menos ele lembrou”, foi o que veio na minha cabeça. Comecei a abrir e descobri o objeto misterioso: Era um kinder ovo.

  Ele deve ter gasto o salário de todo um mês nisso, pensei com os olhos cheios de lágrimas. Seria a primeira vez que eu iria experimentar aquele doce que todos falavam tão bem. “Com surpresa”, dizia a embalagem. Comi uma metade com a maior satisfação do mundo, e guardei a outra metade para depois. Agora eu queria descobrir que surpresa era aquela dentro da cápsula laranjada.

  Abri com cuidado e olhei para o pequeno pedaço de papel que estava lá dentro. Estava enroladinho e parecia conter alguma tinta preta bem forte nele, desenrolei e vi que só tinha uma única letra no meio de vários asteriscos:

**** *E** ****

  O que eu deveria fazer com aquilo? Tentei ver contra a luz, tentei passar os dedos nos asteriscos mas nada parecia mudar. Deixei ele de lado e continuei minha vida.
  Um ano se passou, e no meu próximo aniversário ganhei outro kinder ovo. Esse tinha sido um ano bom, meu pai passou a maior parte do tempo no seu novo emprego e eu ficava sozinho pela casa o dia inteiro, sonhando acordado ou inventando brinquedos novos utilizando pedaços de pau e cocôs endurecidos.

  A surpresa do meu novo kinder ovo foi a mesma do ano passado, mas agora era outra letra que aparecia:

**** **** *A**

  Isso estava ficando estranho, e todos os anos eu ganhava sempre a mesma coisa, e sempre a mesma coisa aparecia, e no final eu guardava os papéis em cima do meu guarda-roupas e esquecia daquilo. Poderia ser um grande segredo, mas eu perdia o interesse muito rápido nele.

M*** **** ****

  No meu aniversário de 16 anos resolvi pegar todos os pedaços de papel e ver se aquilo fazia algum sentido. Eu já estava mais maduro, tinha uma namoradinha e dificilmente apanhava do meu pai, eu estava muito mais forte do que ele, eu estava muito mais forte do que muita gente. Porra, eu era praticamente um monstro.

  E agora tenho 20 anos, escrevo esse texto diretamente da maravilhosa e receptiva Penitenciária Estadual de Piraquara II, onde pretendo usufruir de suas instalações por pelo menos mais uns 30 anos. A mensagem revelada nos kinder ovos durante todos esses anos dizia o seguinte:

MATE SEUS PAIS

  E foi exatamente o que eu fiz…

A liberdade de expressão dos manipulados pela loucura

Postado por Luan Henrique | | Posted On sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013 at 12:36

shhh

  Me lembro como se fosse ontem, eu estava na platéia de um desses programas domingueiros de auditório onde eles levam vários convidados diferentes que bombaram aquela semana, eu estava na primeira fila, um dos jornalistas da emissora que esperavam pacientemente o show terminar para entrevistar alguns convidados, para dar um tipo de complemento a mais no ego dessas pessoas.
  O dia exato era 25 de agosto de 2017, e os convidados ilustres daquele dia eram Carlinhos carioca – nova sensação do estilo recém-apelidado de “Funk requebrão”, Zé da Bóça – um comediante hilário que fazia várias referências irônicas ao humor do começo dos anos 2000, um ex-blogueiro aposentado que ninguém se lembra do nome e estava lá apenas porque comia o produtor, um ex-BBB tão irrelevante quanto o anterior e Mathias, um escritor de sucesso que estava lá para divulgar seu novo best-seller: “A balada da melancolia de uma alma qualquer”, que já havia vendido mais de 5 milhões de cópias só na cidade de Manaus.

  O programa estava na mesma mesmice desde o começo, músicas ao vivo, algumas perguntas imbecis para os convidados, alguns quadros cômicos e outros tristes para fazer as tiazinhas de casa chorarem, muita propaganda e mulheres semi nuas para apelar um pouco e trazer o público masculino que não possuíam tv a cabo e ganhar alguma audiência.
  Quase no final do programa, o apresentador – que estava suado e enxugava seu suor disfarçadamente a cada 5 minutos longe de qualquer câmera – resolveu se despedir de seus convidados perguntando se eles tinham perguntas para fazer a seus companheiros, sobre seu trabalho ou vida pessoal, ele foi bem claro nisso, e após o ex-BBB pedir para que o Zé da Boça imitasse o Felipe Neto, Mathias, que havia ficado quieto quase o programa inteiro, só falando quando lhe dirigiam a palavra, se levantou de seu banquinho e disse para o apresentador:
- Por favor, antes de terminar eu tenho uma observação a fazer.
- Claro, prossiga Mathias, Mathias pessoal, é o maior vendedor de livros da história desse país, e seu novo sucesso está a venda nas melhores livrarias, ou se você preferir, pode pedir online em nosso site que está aparecendo nesse momento em baixo de sua telinha, mas diga Mathias, qual a sua observação?
  Olhando com uma cara de tédio ligeiramente cômica sobre aquela situação, Mathias se aproximou do centro do palco e disse perto do microfone que haviam lhe dado:

- Carlinhos Carioca, o senhor é um tremendo de um babaca.

  A euforia tomou conta do lugar, algumas pessoas ficaram em silêncio esperando por uma resposta, outras aplaudiram e algumas até se deram ao luxo de acordar.

- Como assim Mathias brou? Du quê tu tá falandu véio?
- Eu to falando que você é um babaca sem talento que está levando a nossa geração até a beira do abismo e dando o chute final em suas bundas.

  O apresentador ficou sem palavras nessa hora, isso nunca havia acontecido em seu programa ao vivo em mais de 30 anos de existência, ele ficou boquiaberto por alguns momentos até conseguir achar as palavras calmas de sabedoria que haviam lhe ensinado a dizer em momentos propícios a isso: “ Ô loco meu”.

- E digo mais Carlinhos, você pode até ser a sensação do momento, levando garotas de 12 anos aos seus bailes pornográficos e as transformando em tremendas vadias, suas letras de 3 linhas não tem conteúdo algum e se conseguem passar alguma mensagem para as pessoas anencéfalas que o escutam, essa mensagem é tão desprezível que qualquer pessoa com o mínimo de senso crítico percebe que você não passa de um bonitão metido a bandido que está se tornando o cafetão desse país, em uma de suas letras você diz o seguinte: “bandido que é bandido nunca pega em um livro, sou rico sou fodão, e o que você tem professor? Sua cara no meu três-oitão” Isso nem ritmo tem.
- E quem é você pra me dizer essas coisas seu palhaço, minhas músicas levam o conhecimento das ruas que eu desenvolvi para ajudar quem precisa.
- Ninguém precisa aprender a ser puta ou a ser bandido, as pessoas precisam de cultura, não precisamos de mais violência, precisamos de um país sem gente como você nos dizendo o que fazer, sem gente como você manipulando a cabeça dos nossos jovens, sem gente como você se tornando senadores, deputados, e até presidentes, não quero que meu neto, que ainda está para nascer, sofra bullyng na escola só porque os pais dele ensinaram ele a ler, não quero que a próxima geração seja um bando de alienados que dão dinheiro para grupos de “funk requebrão” só para poderem rebolar na cara de vagabundos e popular ainda mais o nosso mundo com o lixo que você é.
- Ti respeitu manu pela corage de falá isso na minha cara mas isso num vai ficá assim não maluco.
- O que você vai fazer? Me processar? Isso não irá me diminuir, poderá me deixar mais pobre, é claro, mas não vai me diminuir. E pare de tentar parecer legal falando errado desse jeito, todo mundo sabe que é fingimento, você falou de forma correta e usando até vírgulas na sua última fala. Sabe quantas pessoas já me chamaram de babaca na vida? Milhares, e eu não processei nenhuma, sabe o que eu fiz? Melhorei, melhorei para me tornar um ser melhor. Você pode ser um babaca hoje, mas vai parar pra pensar e descobrirá que é bom em alguma coisa, e nessa coisa você irá se vangloriar, irá ser alguém e irá se dar muito melhor na vida. Aposto com você que seu “sucesso” não durará nem 3 anos, porque você é falso e estúpido, e as pessoas esquecem dos falsos e estúpidos, o problema é que virão milhares iguais a você e foderão com nosso mundo.
- Pô véi - desculpa, força do hábito - amigo, você está certo, sabe o que eu sempre quis ser? Bailarino, mas os manos da quebrada me julgavam por causa disso e resolvi cantar. Vou voltar a dançar, e dane-se quem não gostar.
- Esse é o espírito.

  A platéia aplaudiu, as pessoas de casa aplaudiram, o apresentador chorou e, porra, até eu me emocionei. Carlinhos agora dança e Mathias continua um escritor de sucesso e milionário. O mundo parecia que iria voltar aos eixos, se, duas semanas depois, um jornalista muito astuto não tivesse descoberto que toda essa encrenca foi forjada pela emissora para ganhar audiência. Esse jornalista não tornou isso público, claro que não, ela era poderosa demais para ele, mas pelo menos alguém sabia quem era a verdadeira ameaça para o nosso país…

 
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